Saturday, August 18, 2007

Dialogando com o silêncio

Re-leitura da Poesia "Senão Palavras".

O tema silêncio pode ser fruto de muitas inspirações, Bachelard aborda silêncio como necessário ao processo criativo científico ou artístico, associado ao amor, vai dar algumas páginas se não livros de poesias. Imagino que o silêncio é indispensável ao amor. Se imaginarmos o amor como fruto de um processo criativo, a dois e ao mesmo tempo solitário, é necessário alguns momentos de silêncio para se construir o amor.
O que se pergunta é sobre o amor, e não o silêncio, é o amor o silêncio? Ou é o amor as palavras? Na minha poesia percorro por caminhos incertos para revelar de forma abrupta no final que o amor é o silêncio, negando a poesia inteira que afirma que é a palavra. Não é uma negação total, são dois momentos diferentes, o trivial vive as palavras, mas o transcendente vive o silêncio.
Na realização do amor se quebra ou se permanece o silêncio? Talvez o que gostaria de dizer é que o amor é o momento do silêncio, tudo depois é o amor em palavras. A palavra nunca trará a essência, pois é viciada...poderia dizer que o amor é a voz do silencio, mas a palavra não consegue ser a voz do amor; é sempre insuficiente, por isso se fala tanto, ou se pensa, a palavra em pensamento também faz muito barulho.
A sua poesia me lembrou um livro de Pablo Neruda, chamado "Livro das Perguntas", afirma muito pouco...poderia refazé-la e colocar ela toda em pergunta, esteticamente seria interessante, já que a poesia é marcada pela incerteza da palavra. Você abordou uns pontos centrais do que desejava passar. E gosto da noção de silêncio, não como uma oposição ou ausência de palavras, mas integradora da palavra, é muito mais digno o silêncio que a palavra, que se submete e se rende ao silêncio, poderia dizer que se rende ao amor, mesmo no instante (que é outra possibilidade de tema, o instante, o momento, o tempo). Isso tudo se repete pelos sentimentos do poeta.
Para Fernando Pessoa, o silêncio na poesia "Hora absurda" parece ser inquieto, é como se o silêncio deixasse algo em suspensão e pronto para acontecer, o primeiro verso:

"O TEU SILÊNCIO é uma nau com tôdas as velas pandas...
Brandas, as brisas brincam nas flâmulas, teu sorriso...
E o teu sorriso no teu silêncio é as escadas e as andas
Com que me finjo mais alto e ao pé de qualquer paraiso..."

O silêncio deixa as velas infladas, mas batem as brisas que não são suficientes para dar partida a nau, o sorriso quebra o silêncio, ao mesmo tempo que permanece, mas é algo que o eleva, se finje alto e no paraíso. "Pandas" é a mesma coisa que 'infladas", e "andas" a mesma coisa que "perna de pau". A imagem da escada não seria suficiente para saber se subia ou descia colocou assim "andas" e permanecia a rima e o ritmo da estrofe, eu creio. Gosto desta visão de Pessoa.

Gostaria de afirmar este e outros diálogos contigo, aceitando ser o interlocutor da nossa poesia e da nossa psicologia, através de Drummond.

"Há tantos diálogos
Diálogo com o ser amado
o semelhante
o diferente
o indiferente
o oposto
o adversário
o surdo-mudo
o possesso
o irracional
o vegetal
o mineral
o inominado

Diálogo consigo mesmo
com a noite
os astros
os mortos
as idéias
o sonho
o passado
o mais que futuro

Escolhe teu diálogo
e
tua melhor palavra
ou
teu melhor silêncio
Mesmo no silêncio e com o silêncio
dialogamos"

Drummond

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